"E Deus amou o mundo de tal maneira, que entregou o seu filho unigênito, para que todo aquele que nele crer, não pereça, mas tenha a vida eterna" João 3.16

A Igreja de Esmirna

Esta carta se inicia com a revelação de um dos nomes de Jesus:

Estas coisas diz o primeiro e o último, que esteve morto e tornou a viver. (Ap 2.8)

Em outras palavras: Eu sou a ressurreição e a vida. Por que o Senhor se revela dessa maneira tão linda para a igreja em Esmirna? Porque essa era uma igreja de mártires.

A igreja em Esmirna é um quadro profético da Igreja dos segundo e terceiro séculos. Esse foi o período de maior perseguição da história da Igreja. 

Os romanos tinham uma diversão abominável, gostavam de ver leões comerem cristãos vivos. No Coliseu, colocavam de um lado os leões, que ficavam sem comer nada por até dois meses, e do outro os cristãos. O resultado era um rio de sangue. Houve ocasiões em que morreram tantos cristãos, que o sangue na arena dava até nos tornozelos (pessoas que tem prazer em ver sangue, filmes de terror, lutas, etc...). Diz a história que, em certas ocasiões, havia tantas pessoas na arena que os leões recuavam com medo. Os próprios cristãos eram obrigados a atiçar os animais para que fossem atacados por eles. 

A maioria dos cristãos da igreja em Esmirna morreu na arena, lutando contra leões famintos. A História diz que eles entravam na arena cantando hinos ao Senhor. Em Roma ainda existe o Coliseu. Esse terrível anfiteatro, com capacidade para vinte mil pessoas, testemunhou o martírio do maior número de crentes em toda a História. É um lugar amaldiçoado – habitação de demônios, com certeza. 

Essa foi à era da igreja de Esmirna. Uma época em que se tornar um cristão era simplesmente comprar um bilhete para a eternidade. Era uma época em que se decidir por Jesus era constituir-se um traidor do Estado. Os cristãos teimavam em dizer que “Jesus Cristo é o Senhor”. Isso era um crime uma vez que apenas o imperador poderia ser chamado de senhor.



1) A revelação do Senhor — 2.8

A palavra Esmirna vem de mirra e significa sofrimento. Essa igreja representa as igrejas sob perseguição. É para elas que o Senhor diz: Eu sou o primeiro e o último. Eu estou vendo o começo e também estou garantindo o final da história. Eu estive morto, mas revivi. Vocês estão morrendo e vão reviver também. O nome do Senhor supre a nossa fé. O Seu nome é tudo de que necessitamos.



2) A mensagem à igreja — 2.9 e 10

Não há reprovação para essa igreja, todavia não há elogios também. Aqui o Senhor conforta e consola. É uma igreja sofredora. Não possui muitas obras porque não tem condições de trabalhar, a perseguição é grande. O Senhor diz:

Conheço a tua tribulação, a tua pobreza (mas tu és rico). (Ap 2.9) 

Existem grandes igrejas que embora ricas foram chamadas de pobre e a igreja de Esmirna poderia ser pequena, mas foi chamada de rica.



a) Tribulação e pobreza - v. 9

Revelando-se como aquele que esteve morto e reviveu, o Senhor está falando da Sua ressurreição. A tribulação é um meio que Deus usa para que possamos experimentar o poder da ressurreição (Fp 3.10). É em meio ao sofrimento que podemos vencer a morte. 

Além de atribulada, a igreja era pobre. Alguém pode perguntar: é preciso ser pobre para tornar-se um vencedor? Certamente não precisamos ser pobres para sermos vencedores, mas Jesus disse que é mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus (Mt 19.24). Ele falou isso com respeito ao reino e não com respeito à salvação. Todos concordamos que um rico pode ser salvo, mas a chance de um rico vir a ser um vencedor é a mesma de um camelo vir a passar pelo fundo de uma agulha.

O Senhor diz que eles eram naturalmente pobres, mas espiritualmente ricos. Evidentemente pobreza material não resulta automaticamente em riqueza para com Deus. Infelizmente existem pessoas que são pobres de dinheiro, pobres de mente e também pobres de experiência com Deus. Pobreza por si só não é sinônimo de humildade. É possível ser pobre e, ao mesmo tempo, arrogante e pretensioso, ainda que isso seja mais raro. Mas sobre os ricos não há o que discutir, sua atitude é sempre pretensiosa e autossuficiente. Por pensarem que não precisam de Deus, sua postura é de arrogância.

Apesar disso, não devemos olhar para o exterior, pois o valor do homem não está nos bens que ele possui (Lc 12.15). O que importa é o quanto acumulou diante de Deus. O vencedor é aquele que é rico para com Deus. Ele pode ser pobre financeiramente, mas o que importa é o fato de ele ter acumulado tesouros no céu. Essa igreja estava acumulando tesouros no céu, por isso o Senhor disse que ela era pobre aqui, mas será rica lá. 



b) Os que se declaram judeus - v. 9

O verso nove diz:

Conheço (...) a blasfêmia dos que a si mesmos se declaram judeus e não são, sendo, antes, sinagoga de satanás. (Ap 2.9)

É possível existir um judeu falso? Como identificar o verdadeiro judeu? Romanos 2 afirma que o verdadeiro judeu não é aquele que nasceu de pai e mãe judeus, nem é aquele que foi circuncidado. O verdadeiro judeu é aquele que o é interiormente. Paulo diz que:

Judeu é aquele que o é interiormente, e circuncisão, a que é do coração, no espírito, não segundo a letra, e cujo louvor não procede dos homens, mas de Deus. (Rm 2.29)

Os judeus que perseguiam a igreja em Esmirna eram judeus na carne, mas eram falsos judeus diante de Deus, porque o verdadeiro judeu é aquele que tem o coração circuncidado para amar a Deus. O Senhor os chama de sinagoga de satanás, ou seja, habitação de demônios.

Ser um vencedor nessa igreja é rejeitar tudo aquilo que vem do judaísmo. Não devemos tentar transformar-nos a nós mesmos em judeus, nem ousar transformar a igreja em algo judaico porque isso não procede do Senhor. Como podemos identificar conceitos e práticas judaicas na igreja? O judaísmo possui quatro características básicas. 

i) A primeira delas é o templo. O templo era o centro da religião judaica (naquela época o templo era consagrado e também os utensílios do templo o eram). Outro exemplo é o do nazireu que era consagrado pela vida toda para cumprir um propósito. No Velho Testamento, Deus não habitava em qualquer lugar, Ele habitava em um país chamado Israel. Mas, mesmo em Israel, Ele não habitava em qualquer lugar, mas em uma cidade chamada Jerusalém e, mesmo em Jerusalém não era em todas as casas que Ele estava, mas somente num prédio chamado templo e, mesmo no templo, só numa parte chamada Santo dos santos. Se um judeu queria adorar a Deus, teria que ir para o templo porque era lá que Deus habitava. 

Nós somos o templo de Deus hoje. Estritamente falando, o Cristianismo é uma religião que não possui edifícios, nem templos. O judaísmo tinha um templo, nós não os temos mais. Se voltarmos a estabelecer prédios como templos, incorreremos em um retrocesso ao judaísmo.

Ser um vencedor hoje é entender que somos o templo de Deus e que Deus não habita em prédios. Nós somos Sua morada. Deus não mora no prédio da igreja. Quando você vai embora depois do culto, Ele o acompanha. Ele habita com você, porque sagrado é você, e se você está cheio de Deus, aonde você for, torna-se sagrado também (tem crente que acha que o altar é santo). Somos o Seu templo e O carregamos dentro de nós. Onde nós pisamos, Deus finca Suas pegadas; aonde nós chegamos, Deus chega junto.

Alguns pastores religiosamente terminam o culto orando: “agora despede-nos em paz”! Pode-se ouvir o Senhor dizendo: “Eu não despeço não. Vou embora junto com vocês”! Outros começam o culto orando solenemente: “agora, entrando em tua presença”! Fico pensando, onde é que estavam antes? Outros pedem que as pessoas venham ao altar se referindo ao tablado do púlpito. Acreditar que Deus habita num prédio é heresia. Essa visão templista é um sério entrave ao mover de Deus.

Mais uma vez, a visão celular é o caminho do vencedor. Cada instituição é a cara do prédio onde se reúne, mas uma igreja em células não existe em função do prédio onde se reúne. O prédio para nós é apenas um lugar de treinamento e celebração, a vida normal da igreja acontece em outros lugares em nosso dia-a-dia. Apesar de, no Velho Testamento, Deus habitar num templo, isso já não acontece no Novo Testamento. Hoje nós somos o Seu templo, é em nós que Ele habita. Assim, biblicamente falando, a Igreja do Novo Testamento possui um lugar de reunião, mas não possui templos.

Os templos representam uma grande contradição do cristianismo. Na verdade, eles não existiam até o segundo século. Se você procurasse pela igreja no primeiro século, seria conduzido a um grupo de pessoas se reunindo numa casa, porque eram em lares que eles se reuniam.

ii) A segunda característica básica do judaísmo é a lei. Não há judaísmo sem a lei. A lei era o centro da vida do povo. Para o autor da Carta aos Hebreus, a lei dos judeus era escrita em tábuas de pedras, mas a lei da nova aliança, o Novo Testamento, é escrita nos nossos corações (quem tem tatuagem? João comeu um livro, Ezequiel também) (Hb 8.10). O Espírito nos ensina a respeito de todas as coisas. A lei do Espírito foi impressa dentro do nosso próprio espírito e não precisamos mais seguir a lei de Moisés. Seguindo a lei do Espírito nós acabamos por cumprir a lei de Moisés, porque a lei do Novo Testamento é superior. Não se trata de uma questão de decorar normas e regras, mas de ter uma pessoa viva residindo dentro de nós. Ninguém pode seguir a lei e cumprir plenamente a vontade de Deus. Para isso precisamos ter a lei do Espírito da vida, uma pessoa dentro de nós falando conosco, orientando-nos e dirigindo-nos.

Não temos que seguir nenhuma liturgia ou tradição judaica, como luas novas, festas e coisas semelhantes. Nem devemos mais celebrar a festa dos tabernáculos ou a festa de pentecostes. Hoje o nosso pentecostes é o Espírito Santo de Deus, o nosso tabernáculo é o Senhor Jesus que desceu do céu e veio habitar conosco e em nós. Ele é o nosso tudo. O cumprimento de tudo e tudo se resume nEle, porque o fim da lei é Cristo para justiça de todo aquele que nEle crê (Rm 10.4). Não devemos mais seguir leis exteriores. O Espírito da Verdade nos conduz a toda verdade. 

iii) A terceira característica do judaísmo é a sua classe sacerdotal. Atualmente, no cristianismo não existe uma classe sacerdotal, todos somos sacerdotes do Senhor, como diz Pedro:

Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz. (1Pe 2.9)

Os irmãos de Esmirna eram perseguidos por esses falsos judeus que queriam transformar a igreja em um pedaço de Israel. Também hoje temos pessoas que querem transformar a igreja numa sinagoga judaica. 

iv) A quarta característica distintiva do judaísmo são as promessas de Deus. O Senhor cumprirá as promessas feitas aos judeus porque Ele é fiel. No entanto, o autor de Hebreus diz que as nossas promessas são superiores, porque são baseadas em uma aliança superior:

Agora, com efeito, obteve Jesus ministério tanto mais excelente, quanto é ele também Mediador de superior aliança, instituída com base em superiores promessas. (Hb 8.6)



c) Tribulação de dez dias

Finalmente, o Senhor diz a esta igreja:

Não temas as coisas que tens de sofrer. Eis que o diabo está para lançar em prisão alguns dentre vós, para serdes postos à prova, e tereis tribulação de dez dias. (Ap 2.10)

Como não ficou na História nenhum registro acerca de uma tribulação específica de dez dias, cremos, mais uma vez, que se trata de algo simbólico. Precisamos entender o sentido à luz da própria Palavra. Há outras ocasiões na Bíblia em que um período de dez dias é mencionado. Duas delas, no Antigo Testamento, falam de um período de dez dias. A primeira foi quando Abraão mandou Eliézer à terra de seus pais, para buscar uma esposa para Isaque. Quando o servo de Abraão chegou ao destino, escolheu Rebeca, a família pediu-lhe dez dias para despedir-se da moça (Gn 24.55). O segundo caso se deu quando Daniel, Hananias, Misael e Azarias pediram ao cozinheiro do rei Nabucodonosor para não se alimentarem da comida real, imprópria aos judeus, mas apenas de legumes e água durante dez dias. Era um tempo de teste. Se, ao fim desses dez dias, eles tivessem uma melhor aparência do que os demais continuariam alimentando-se conforme o costume judaico (Dn 1.12).

Esses dez dias significam um período pequeno, porém completo, de teste e de prova. Tribulação de dez dias é uma tribulação completa. O vencedor será testado em um tempo completo de tribulação determinado por Deus.

A igreja de Esmirna estava sofrendo. Todavia, esse sofrimento era conhecido diante de Deus e determinado em sua soberania. Isso é um grande consolo: toda tribulação pela qual temos de passar, tem um tempo determinado e conhecido diante de Deus. Nunca vai além do que está estabelecido. Também jamais excede os limites de nossas próprias forças. Não significa, porém, que seja um período literal de dez dias, e sim, um espaço de tempo, breve, determinado pelo Senhor (1Co 10.13). Levou 24 anos para Deus cumprir o que falou a Abrahão e lhe prometeu um filho- Deus não trabalha no nosso tempo (chronos).... existe também a história do povo de Israel que ficou no deserto porque não foi aprovado (existe a tribulação que Deus permite e outra que você permite) Daniel levou 21 dias para receber a resposta- Eclesiastes 3 fala de um tempo determinado por Deus para tudo- Jonas ficou três dias, mas quando reconheceu o Senhor lhe ouviu- Elias ficou na caverna por quanto tempo?

Lázaro ficou quatro dias morto, mas ressuscitou – Quanto tempo Jó teve que suportar a prova que recebeu? 

3) A recompensa do vencedor — 2.11

Ao vencedor o Senhor diz:

Sê fiel até a morte, e dar-te-ei a coroa da vida (Ap 2.10).

Fiel até ao ponto de morrer e fiel até a morte chegar. A “coroa da vida” é um prêmio concedido apenas aos vencedores. Eles também de nenhum modo sofrerão o dano da segunda morte, mencionado no verso 11.

Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas: O vencedor de nenhum modo sofrerá dano da segunda morte. (Ap 2.11)

Este dano refere-se ao prejuízo que alguns crentes terão por ocasião do Tribunal de Cristo. Embora a segunda morte não tenha poder sobre nós, pode-se vir a sofrer algum dano semelhante.

Escrevendo aos coríntios, Paulo diz que nossas obras serão testadas diante de Deus pelo fogo: 

Manifesta se tornará a obra de cada um; pois o Dia a demonstrará, porque está sendo revelada pelo fogo; e qual seja a obra de cada um o próprio fogo o provará. (1Co 3.13)

Todavia, sabemos que a obra de alguns se queimará, por serem desqualificadas, mas eles mesmos serão salvos como que através do fogo.

Se permanecer a obra de alguém que sobre o fundamento edificou, esse receberá galardão; se a obra de alguém se queimar, sofrerá ele dano; mas esse mesmo será salvo, todavia, como que através do fogo. (1Co 3.14,15)


Observe que o crente com obras erradas sofrerá um dano por meio do fogo. Ele mesmo será salvo, mas haverá um dano. Esse é o dano da segunda morte. O vencedor não sofrerá de forma alguma esse dano ou disciplina.